Na Igreja Positivista do Brasil se pratica a Religião da Humanidade, doutrina criada pelo filósofo francês Auguste Comte (1798-1857). Trata-se de uma religião agnóstica, não transcendental, fundamentalmente humana, onde se presta homenagem aos homens e mulheres cujo talento e pensamento marcaram a Humanidade.
A história da Religião da Humanidade está ligada ao encontro de Auguste Comte e Clotilde de Vaux (1815-1846), em Paris, em 1845. Comte ao conhecer Clotilde se apaixonou imediatamente por essa jovem mulher casada, porém abandonada pelo marido, que se exilou na Bélgica para escapar de dívidas de jogo. Embora Clotilde não tenha manifestado o mesmo tipo de sentimentos pelo filósofo, os dois iniciaram uma intensa amizade e relação intelectual e epistolar – foram 183 cartas trocadas em um ano, até o falecimento de Clotilde, vítima de tuberculose. Essa experiência dolorosa firmou a compreensão, aos olhos de Comte, da supremacia do sentimento sobre a racionalidade para a elevação moral dos homens. Inspirado portanto no sentimento amoroso despertado por Clotilde, Comte começa a elaborar, a partir dos anos 1850, as bases de uma “religião positiva”, em torno de princípios cívicos e morais como o altruísmo e a honestidade. Seus rituais e sua iconografia são inspirados na religião católica, depuradas as crenças metafísicas da mesma.
Na Religião da Humanidade, todavia, não há um Deus sobrenatural, nem vida após a morte. Nela, presta-se homenagem à Humanidade, compreendida como o conjunto dos homens vivos e mortos. Seu culto reverencia os antepassados, em prática ritualizada que tem por finalidade fortalecer o laço social entre os homens, a solidariedade entre as gerações e a transmissão do conhecimento. Tal prática também garante a continuidade da História, compreendida como um processo estimulado pelo aperfeiçoamento do conhecimento e orientado para o progresso. Em seu calendário, a Religião da Humanidade celebra homens e mulheres que contribuíram para fortalecer os valores e impulsionar a história da civilização Ocidental. A Humanidade é representada por uma mulher com os traços de Clotilde de Vaux, com uma criança no colo, símbolo da continuidade entre as gerações.
A formulação da Religião da Humanidade provocou divisão entre os discípulos de Comte. A doutrina religiosa prosperou em diversos países da Europa, nas Américas e na Ásia. No Brasil, ela recebeu o primeiro templo construído exclusivamente para seu exercício, segundo orientações deixadas por Auguste Comte: o Templo da Humanidade, situado no Rio de Janeiro. Também foi no Brasil onde a Religião da Humanidade ganhou maior número de adeptos, causando impacto decisivo em suas instituições e reformas políticas.
Atualmente o pensamento religioso de Comte tem despertado interesse em artistas e pesquisadores. Sua compreensão visionária de uma crise da racionalidade, e o atual retorno do sentimento religioso no mundo contemporâneo, inclusive em suas vertentes fundamentalistas, estimulam novas abordagens da obra de Comte.